Casa do Estudante de Natal
Atenção a todos!!! Quando usar o banheiro, jogue um balde
d’água nas fezes! Dessa maneira, evitamos a bagunça que os ratos fazem com sua
m…!”. O aviso exclamativo e escatológico está fixado acima de mictório de um
dos três banheiros que ainda funcionam na Casa do Estudante de Natal. O prédio
histórico, construído em 1856 e transformado em hospedaria para jovens oriundos
do interior do Estado 90 anos depois, vive um processo de degradação que parece
inacabável. Da calçada é perceptível o cheiro de dejetos humanos, animais,
alimentos estragados e mofo, que deixa o lugar com ares de presídio.
Na manhã desta terça-feira (19), a reportagem esteve no
local e constatou a fedentina que, aliada aos forros e rebocos corroídos,
oferecem uma imagem condizente com um ponto de encontro para viciados em
drogas, ao contrário do motivo maior: oferecer apoio logístico para a parte
mais pobre da juventude potiguar. Água suja e urina no chão, teto com manchas
verdes de infiltração, mosquitos, gatos, pichações compõem o cenário de um
salão que um dia serviu de lugar para leitura. No pátio central, alunos e
desocupados assistem televisão em meio às moscas.
A situação é a pior dos últimos anos, segundo os
residentes. O que outrora fora um refeitório, agora é um galpão abandonado com
janelas quebradas, sujeira onipresente e o fantasma do que um dia serviu de
moradia para norte-riograndenses ilustres. Nos quartos, fios expostos e paredes
descascadas. O perigo e a falência moral aparecem em cada cômodo (51 ao
todo). Mesmo assim, o tom das reclamações é ameno. “Na minha cidade,
todos que têm alguma coisa, passaram por aqui”, diz Marco Antonio, de 22 anos,
que há quatro trocou Pilões, no Alto Oeste, pela Casa do Estudante.
Em pleno recesso estudantil, durante o mês de janeiro, a
Casa foi invadida por marginais que arrombaram dois quartos. “Antes,
professores bons vinham dar aula de graça, como um reforço, aqui pra nós. Agora
não vem mais ninguém, pela situação que isso está aqui. Antes funcionava tudo”,
diz Marco Antonio, aluno de um cursinho pré-vestibular. Ao custo de R$ 20 por
mês, ele e mais 180 estudantes têm a disposição água encanada, energia,
telefone e alimentação.
Para Deividem Lisboa, jovem natural de Pau dos Ferros que
trancou a faculdade de Direito, a vulnerabilidade começa com a alvorada: “Aqui
de dia não tem vigia e à noite só tem um sargento aposentado da PM. Eu quero
ficar só mais um ano, no máximo. Não tem condições de viver nessa imundície
toda” – como apoio às cinco instituições de direito privado que abrigam
estudantes no Estado, a Secretaria do Trabalho, da Habitação e da Assistência
Social (Sethas) faz um repasse de R$ 150 mil.
A administração da Casa do Estudante está sob
responsabilidade do ex-cozinheiro Luiz Alves. Há 28 anos, ele convive com
grupos de jovens. “O quarto depende de cada um. Todo mundo é de maior (sic). Só
que ali, tem muitos que não são estudantes, são elementos que não estudam, mas
não saem da Casa. Eu não posso pegar na mão deles e botar pra fora”. Ciente da
cena dantesca, ele diz que está em fase de regularização dos documentos da
instituição para solicitar melhorias para o prédio.
Do outro lado da mesa de negociações, à espera de Luiz
Alves, está o secretário Luiz Eduardo Carneiro Costa. “Não gerimos a Casa do
Estudante. Damos um apoio pagando as contas básicas. Desde o ano passado,
estamos esperando essa documentação. Mas até agora, nada. Não podemos fazer
tudo por eles. A ideia é que eles procurem parceiros, e nós somos parceiros.
Estamos aqui para ajudar. Cheguei a falar com a Fundação Banco do Brasil, mas
eles [a administração da Casa] não retornaram até agora, mesmo eu oferecendo a
estrutura da secretaria para ajudá-los na elaboração dos projetos”.
No meio do imbróglio, o prédio histórico tem o emblema da
negligência em duas placas, uma inaugurada pelo então governador Vivaldo Costa,
em 1994, e outra na gestão Cortez Pereira, em 1973. Fé e desenvolvimento são
mesclados em textos fora da realidade observada e mantida pelos últimos
governos. A primeira diz que [...] aos estudantes que vivem nesta casa a
esperança de um futuro melhor para o nosso Estado”. Enquanto a segunda, traz
entre outros dizeres “[...] que Deus nos ajude a nós, Rio Grande do Norte, Povo
e Governo, para sermos, na nossa dimensão, a dimensão grande que é o Brasil”.
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