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Procurador alerta: “Governo do Estado vai pagar R$ 1,3 bilhão pelo Arena das Dunas”


Agraciado nesta semana com o título de cidadão potiguar pela Assembleia Legislativa, o procurador-geral do Ministério Público de Contas, Luciano Ramos, concede entrevista a’O Jornal de Hoje e comenta a situação atual das contas públicas, segundo ele, comprometidas por uma máquina pública estadual inchada e descontrolada – comprovada por pagamentos feitos a pessoas que não eram mais funcionários ou já estavam mortas, no início da atual gestão estadual.

Por isso, não é por acaso que Ramos coloca a folha de pagamento como o maior desafio para o próximo Governo e afirma que é fundamental um choque de gestão para fazer o Rio Grande do Norte sair da condição de limite prudencial, estabelecido pela Lei de Responsabilidade Fiscal. Luciano Ramos também fala sobre a situação do contrato firmado para a construção da Arena das Dunas, que consumirá, num total, R$ 1,3 bilhão dos cofres públicos.

Confira a entrevista com Luciano Ramos na íntegra:

O Jornal de Hoje: No início deste ano, o Ministério Público de Contas solicitou uma inspeção extraordinária nas contas do Governo do Estado. Como está esse caso? Já foi analisado?
Luciano Ramos: Esse pedido de inspeção teve uma característica específica porque ele diz respeito a três secretarias. Normalmente, quando se tem uma auditoria, uma prestação de contas, uma inspeção, diz respeito a uma secretaria ou a um poder, ou a um poder, como no caso do ministério Público que, juridicamente, temos ele como um poder. No caso do Poder Executivo, que tem várias secretarias, se tivesse só uma, já haveria uma predeterminação de quem seria o relator, porque para cada biênio a uma resolução do TCE especificando quem será o relator naquele biênio para aquela determinada secretaria. No entanto, no caso da representação, temos três secretarias envolvidas, porque os questionamentos em face da Lei de Responsabilidade Fiscal a serem respondidos, requerem procedimentos nas três secretarias e aí não há um relator pré-definido para esse trabalho. Então, precisamos da fase de definição de quem seria o relator e, agora, depois de ter havido um seqüenciamento natural, um sorteio aleatório, esse processo esta com a conselheira Adélia Sales, que está de férias e está sendo substituída pelo auditor Marco Montenegro, que deve levar o caso a julgamento nos próximos dias.

JH: Qual a importância desse pedido de inspeção?
LR: Eu vejo esse pedido como fundamental. É um pedido que engloba 17 itens, 17 pontos de esclarecimento, dizem respeito a própria capacidade do estado de honrar com suas despesas. E despesas obrigatórios, despesas com pessoal. Ao buscar essa resposta, ao buscar, por exemplo, porque as receitas não estão sendo suficiente para o pagamento em dia dos servidores, uma série de recomendações poderão ser subtraídas desse procedimento para uma melhor gestão das contas públicas e, eventualmente, isso ainda está em apuração, se houver responsáveis identificados por dano ao erário ou qualquer circunstância de irregularidade nas despesas públicas, responsabilizar a quem de direito.

JH: Além de pedir a inspeção, o senhor também comentou o contrato firmado pelo Governo do Estado para a construção da Arena das Dunas. Como o senhor ver essa parceria?
LR: As afirmações que fiz sempre foram relativas ao caminho que o Estado trilhou para dar realizar, para conseguir, cumprir com as obrigações para realizar a Copa do Mundo aqui em Natal. Juridicamente, ele tinha dois caminhos a seguir. Poderia contratar diretamente, como a maioria das obras é, com a Ponte Newton Navarro, por exemplo, via Lei 8.666 (Lei de Licitações), que tem o procedimento normal, natural, já usual. Inauguramos uma nova fase, o primeiro contrato de Parceria Público Privado. A Lei de PPP é de dezembro de 2004, mas entre dezembro e abril de 2011, quando foi assinado o contrato com a Arena das Dunas, nunca tínhamos optado por esse caminho.

JH: E qual a dificuldade de ter escolhido esse caminho de PPP?
LR: Parceria público privada pressupõe uma parceria que, de um lado, o Estado não tenha o poder de investir e que, de outro lado, o parceiro privado possa retirar seu recurso para custear a atividade. E aí, essa construção toda para dizer o seguinte: o grande valor remuneratório do parceiro privado no caso da PPP vem de pagamentos do poder público. Banca todo o empréstimo e mais alguma coisa que a Arena das Dunas pegou para construir o estádio e essas cifras que girariam, se feito diretamente, em torno dos R$ 400 milhões pagos de maneira direta, com mais algum lucro que seria razoável para o ente privado que realizasse, essas cifras, ao se colocar na conta todos os valores pagos, ao longo de 20 anos, passarão da casa do R$ 1,2 bilhão, R$ 1,3 bilhões.

JH: Quais as conseqüências de um contrato como esse?
LR: Essa opção gera um problema para um Estado que já tem dificuldade de receita, de pagamento, que se não houver uma viabilidade econômica muito grande do estádio, se não houver uma receita muito contundente e forte, que me parece que não é a realidade, hoje, existente. Para se ter uma idéia, é claro que não é um simples encontro de débito e credito, mas para haver uma conta que não seja tão contundente para o Estado em relação ao pagamento, só neste ano, teríamos que gerar, de lucro no estádio, mais de R$ 100 milhões, que a gente sabe que não vai acontecer. Eles nem trabalham com essa hipótese. Trabalham com R$ 2 milhões de lucro, o ano todo, porque não está nessa conta os R$ 10 milhões por mês que o Estado irá pagar R$ 90 e tantos milhões por esses 10 meses, aproximadamente, de operação, e ele não terá o retorno desse lucro que ele só recebe a metade, que é o lucro líquido distribuído por dois.

JH: Dá para entender a opção por um contrato como esse?
LR: É. Há algumas dificuldades e alguns problemas em relação à engenharia econômica feita para essa opção via parceria público privada.

JH: Com relação às eleições, qual o trabalho do Ministério Público de Contas nesse processo?
LR: Em relação a eleições, tanto o Ministério Público de Contas, quanto o Tribunal de Contas do Estado, ele tem a seguinte atribuição e estritamente esta, que é dada pela Lei da Ficha Limpa: o TCE ao condenar alguém, verificar que determinadas contas que foram prestadas, quer seja as contas anuais, de um contrato ou de uma licitação, contêm vício insanável, que demonstre atitude dolosa de improbidade administrativa, neste caso, caberá ao TCE – e isso pode ser provado pelo MPJTCE, pelo menos, para início deste processo – identificar essa situação, sancionar essa hipótese e remeter ao Tribunal Regional Eleitoral a lista com aqueles gestores públicos que tenham sido condenados de maneira definitiva, com essa característica, de ato doloso de improbidade administrativa.

JH: Qual o maior desafio da próxima gestão do Governo do Estado?
LR: Sem sobra de dúvida, sem pestanejar, o maior desafio será a folha de pessoal. Na folha de pessoal, nós precisamos ter uma folha que não comporte algumas situações de irregularidades que nos detectamos como, por exemplo, pessoas que não eram mais servidoras públicas e que estavam recebendo por falta de controle. Pessoas até falecidas que, sem nenhuma má fé, por falta de controle mesmo, o dinheiro continuava sendo depositado na conta dessa pessoa e, dois anos depois, é que se percebeu isso.

JH: O Governo fazia pagamentos a pessoas mortas?
LR: Há dois anos, três anos. E isso eu tenho fatos concretos que aconteceram nesse sentido. Então, a maior desafio é ter uma folha de pessoal condizente com o tamanho do nosso estado. A máquina administrativa ela tem que ser um meio para atingir o desenvolvimento do estado, mas muitas vezes a máquina está de tal forma inchada e com gastos excessivos, como foi a hipótese de não implantação do teto (a partir de 2013 se iniciou a implantação) que não há receita suficiente para arcar com essa situação. E do outro lado disso, perceber que o estado está no limite prudencial da Lei de Responsabilidade Fiscal há diversos anos. Até utilizei o nome pleonástico de inércia estacionária no limite prudencial, que a LRF não quer. A LRF quer que se tenha teto financeiro para fazer nomeações, por exemplo, como essas necessárias para a segurança. Não é fazendo ajustes interpretativos que nós vamos resolver esse problema.

JH: É preciso então realizar reduções de gastos com a folha, mas não prejudicar ainda mais os serviços da saúde, segurança e educação?
LR: Sim, sim. Alguns estados, inclusive com receitas muito maiores que a do RN, fizeram esse choque quanto ao tamanho da máquina administrativa, posso citar São Paulo e Minas Gerais. É algo absolutamente necessário. Em algum momento, o Estado terá que fazer para ter um equilíbrio efetivo entre receita e despesa, mas essa adequação, leia-se, priorizando as áreas que não se pode ter qualquer tipo de enxugamento, como saúde, segurança e educação, e verificando nas demais áreas, quais são as situações de inchaço em relação a máquina administrativa.


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