Sem dúvida, o Brasil vivencia uma das maiores crises de
representatividade após o retorno do regime democrático, ou seja, com a criação
de uma pluralidade de pequenos partidos políticos, teve como consequência a
fragilidade das demais agremiações, em outros termos, cada político buscou uma
legenda própria para comandar sem a interferência dos demais e passou a atuar
como verdadeiro dono do partido ou o “cacique” da sua tribo partidária
geralmente composto por familiares.
Quando se trata de fidelidade partidária, se busca na
essência, identificar a quem pertence o mandato eletivo. Na verdade a
legislação não define de forma clara se o mandato, ou melhor, silencia sobre a
fidelidade partidária e não fixou se mandato eletivo pertence ao partido ou
daquele mandatário que se elegeu. Tal dúvida teve que ser resolvida pela
jurisprudência dos Tribunais Eleitorais e o Tribunal Superior Eleitoral veio a
editar a Resolução nº 22.610/07 passando a disciplinar os casos de perda de
cargo eletivo em decorrência de desfiliação partidária sem justa causa e o de
justificação de desfiliação partidária ao mandatário que pretenda pedir a
declaração da existência de justa causa para a desfiliação partidária. Com a
Resolução em vigor passou ao entendimento de que o mandato eletivo pertence ao
partido político e a troca de legenda, digo, sem justa causa, caracteriza a
infidelidade partidária e, consequentemente, a perda do mandato.
A meu sentir, o mandato não pertence ao partido e muito
menos ao mandatário. Explicando melhor, o mandato eletivo é o exercício do
poder (Executivo ou Legislativo), ora, a Constituição Federal é enfática ao
afirmar logo no Parágrafo único do artigo primeiro que todo poder emana do
povo, que o exerce por meio de representantes, logo, eu defendo que o mandato é
do povo, não do partido político e muito menos do mandatário.
Pois superada a discussão doutrinária, o que está valendo
é que o mandato eletivo pertence ao partido político e os mandatários não podem
mudar de legenda sem uma justificativa plausível definida pela Resolução
22.610/07 que serviu de parâmetro para as mudanças posteriores advindas da Lei
nº 13.165/15 acrescentou à Lei dos Partidos Políticos (Lei nº 9.096/95) o art.
22-A à qual transforma em norma jurídica positiva possibilidade de perda do
mandato eletivo em razão da desfiliação, sem justa causa, do partido político
pelo qual foi eleito.
No parágrafo único do mencionado artigo, está elencadas
as seguintes hipóteses de justa causa, i) a mudança substancial ou desvio
reiterado do programa partidário; ii) a grave discriminação política pessoal e;
iii) a mudança de partido político efetuada durante o período de 30 dias que
antecede o prazo de filiação exigido em lei para concorrer à eleição,
majoritária ou proporcional, ao término do mandato vigente.
Em suma, o legislador visando o seu próprio interesse,
abriu a chamada janela partidária através da Emenda Constitucional n° 91/2016,
ou seja, facultando ao mandatário a possibilidade da permuta de legenda, seis
meses antes do término do mandato, dando o aval que corresponde ao terceira
hipótese descrita no artigo 22-A da Lei dos Partidos Políticos, conforme já
descrito acima.
Pois bem, para as eleições deste ano, com fim das
coligações (abordaremos este tema oportunamente), a possibilidade de uma
verdadeira debandada partidária dos mandatários para buscar abrigo em legendas
mais sólidas e então compor e definir os seus quadros partidários para pleitear
uma reeleição, é mais que certa. Mas qual seria o prazo para a permuta de
partidos? De acordo com a Resolução do TSE nº 23.606/2019, o mandatário que
pretende trocar de partido sem afrontar a fidelidade partidária será no período
de 5 de março a 4 de abril de 2020.
Importa destacar ainda alguns cuidados prévios ao
ingressar à nova legenda, como buscar informações se o partido se encontra em
dia com a Justiça Eleitoral, se prestou contas anuais dentre outras medidas de
cautelas. Também é aconselhável, para que não haja dúvida sobre a interpretação
dos 30 dias que antecedem ao último dia do prazo de filiação, não deixar para o
último dia, ou seja, é mais prudente filiar-se à nova legenda até o dia 3 de
abril, para não correr o risco de uma surpresa desagradável futura ou um
entendimento dúbio da Justiça Eleitoral quanto a inclusão ou não do último dia
do prazo.
Põe relevo destacar ainda que a norma da fidelidade
partidária é válida apenas para quem vai concorrer ao mandato legislativo, isto
é, para os vereadores que pretendem mudar de partidos, não se aplica aos cargos
da chapa majoritária. Tal entendimento foi firmado na ADI 5.081/DF, que
considerou o sistema majoritário possuidor uma lógica própria e diversa do
sistema proporcional, em outros termos, segundo o entendimento do Supremo
Tribunal Federal, a candidatura majoritária corresponde maior ênfase à pessoa
do candidato e não o partido político, consequentemente, em casos de perda de
mandato majoritário por infidelidade partidária, haveria uma frustração à
vontade do eleitor e atingiria a soberania popular. Até a próxima.
Nilo Ferreira Pinto Júnior, Advogado e Filósofo,
Professor Universitário, mestre em Direito (UFRN), Doutorando em Filosofia
(UFRN), Ex Juiz do TRE/RN.
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