São onze artigos reescritos e mais um totalmente inédito,
na qual farei um apanhado de como os Tribunais estão se posicionando de um modo
geral sobre a pré campanha, e quanto ao último da vaquinha virtual, além de um
ebook que já disponibilizamos em nosso Instagram @novoeleitoral, ressaltamos,
desde já, que a propaganda que será permitida com o intuito de divulgar
processos de arrecadação de recursos por meio de financiamento coletivo (crowdfunding eleitoral),
que será permitido a partir de maio e que em tese se manterá, por enquanto, o
calendário eleitoral para as eleições 2020 Adiar as
eleições municipais agora? A politicagem vai imperar até na pandemia!.
Estarei revisitando o tema à luz da Res. TSE nº 23.610/2019, que trata da
propaganda eleitoral e pedido de resposta para as Eleições Gerais de 2020.
Segue o primeiro texto:
Há algum tempo venho me preocupando com esse tema, a
partir de minha experiência pessoal e como ex-Juiz Eleitoral, pois apesar
de ser da essência de uma eleição que os possíveis candidatos possam exprimir
as suas ideias, ainda existem limites em vários sentidos para essa liberdade, a
qual, independentemente de qualquer legislação, a nossa Carta Magna a assegura,
entretanto, como todo e qualquer direito, tal liberdade não é absoluta.
Não tenho a menor dúvida que os adeptos da liberdade
total de propaganda em qualquer período têm suas razões e as mesmas encontram
aprumo, não só na própria Constituição, bem como no que se procura aferir no
processo eleitoral, contudo, infelizmente temos realidades em nossa política,
que chamo de politicagem, as quais, no mínimo, impõem um temperamento dessa
posição (Triste
realidade da politicagem brasileira: uma verdade que precisa ser enfrentada com
rigor e firmeza e Triste
realidade da politicagem brasileira II: uma verdade que precisa ser enfrentada
com rigor e firmeza).
E de modo mais claro ainda me refiro à questão do abuso
de poder em seu sentido amplo, pois sabemos que a potencialidade dessa
ilicitude é praticamente irreversível quando bem feita, logo a sociedade em
geral e autoridades em específico não podem olvidar dessa prática quase que
constante em nosso processo eleitoral, daí a preocupação de que a partir da
abertura que indiscutivelmente tivemos com a chamada minirreforma eleitoral,
pode haver várias ilicitudes que serão acomodadas em situações legais,
descumprindo a Lei Maior e desigualando ainda mais o nosso já desigual processo
eleitoral.
Dentro dessa perspectiva, defendemos uma interpretação
sistemática da nova redação do artigo 36A da lei das eleições, do então artigo
2º da resolução 23.457/2015, agora 3º da resolução 23.610/2019, que segue
abaixo, a qual regerá as nossas ponderações adiante:
Art. 36-A. Não configuram propaganda eleitoral
antecipada, desde que não envolvam pedido explícito de voto, a menção à
pretensa candidatura, a exaltação das qualidades pessoais dos pré-candidatos e
os seguintes atos, que poderão ter cobertura dos meios de comunicação social,
inclusive via internet: (Redação dada pela Lei nº 13.165, de 2015)
I - a participação de filiados a partidos políticos ou de pré-candidatos em
entrevistas, programas, encontros ou debates no rádio, na televisão e na
internet, inclusive com a exposição de plataformas e projetos políticos,
observado pelas emissoras de rádio e de televisão o dever de conferir
tratamento isonômico; (Redação dada pela Lei nº 12.891, de 2013)
II - a realização de encontros, seminários ou congressos, em ambiente fechado e
a expensas dos partidos políticos, para tratar da organização dos processos
eleitorais, discussão de políticas públicas, planos de governo ou alianças
partidárias visando às eleições, podendo tais atividades ser divulgadas pelos
instrumentos de comunicação intrapartidária; (Redação dada pela Lei
nº 12.891, de 2013)
III - a realização de prévias partidárias e a respectiva distribuição de
material informativo, a divulgação dos nomes dos filiados que participarão da
disputa e a realização de debates entre os pré-candidatos; (Redação
dada pela Lei nº 13.165, de 2015)
IV - a divulgação de atos de parlamentares e debates legislativos, desde que
não se faça pedido de votos; (Redação dada pela Lei nº 12.891, de
2013)
V - a divulgação de posicionamento pessoal sobre questões políticas, inclusive
nas redes sociais; (Redação dada pela Lei nº 13.165, de 2015)
VI - a realização, a expensas de partido político, de reuniões de iniciativa da
sociedade civil, de veículo ou meio de comunicação ou do próprio partido, em
qualquer localidade, para divulgar ideias, objetivos e propostas
partidárias. (Incluído pela Lei nº 13.165, de 2015)
VII - campanha de arrecadação prévia de recursos na modalidade prevista no
inciso IV do §4º do art. 23 desta Lei. (Incluído dada pela Lei nº
13.488, de 2017).
A ampliação indiscutível dos casos em que o legislador
não mais qualifica como ato de propaganda antecipada, termo que em si é
discutível, pois só temos verdadeiramente propaganda a partir de 16 de agosto,
encurtando-se sobremaneira o tempo para prática de tal ato[1].
Aqui, com a reforma eleitoral de 2017, tem-se uma modificação interessante, que
é a possibilidade de realização de campanha de marketing e publicidade com a
finalidade de arrecadar recursos na modalidade financiamento coletivo, o que já
é permitido a partir de 15 de maio, tema este que abordarei em artigo próprio,
ao final desta série.
Feita tal ressalva, para mim imperiosa a fim de que
os leitores compreendam minha ideia, comentarei amiúde nesse texto inicial
e quantos outros se fizerem necessário, o caput, os incisos e parágrafos
acrescidos e remodelados supra, tudo com o escopo de se comprovar, que mesmo
com a abertura feita pela lei[2],
não se pode admitir um alargamento que permita ao pré-candidato um espaço que o
mesmo não tem em nenhum momento do processo eleitoral.
Quanto ao caput em si, temos que o legislador
provocou de plano a mudança por completo do que vinha sendo compreendido como
propaganda antecipada por parte da doutrina e jurisprudência do TSE, aos quais
eram sólidas no sentido de que mesmo não havendo pedido explicito de votos,
poderíamos ter tal ilegalidade com pedidos implícitos e diversas outras ações
que a caracterizam como irregular.
E agora, basta que não se peça o voto explicitamente e
todo o resto é permitido?
Parece-me que não é bem assim, pois o que se passou a
permitir foi claramente o tratamento de uma figura que antes era muito tímida,
qual seja, o pré-candidato, que ficava “pisando em ovos”, como se diz, quando
era indagado em entrevistas ou até mesmo em sua liberdade de manifestação de
pensamento e daqui pra frente tem uma margem muito grande para expor seus
ideais, projetos políticos na acepção do termo, plataformas, etc, não ligadas a
candidatura em si que não existe, mas ao projeto e partido político que o mesmo
faz parte, daí poder livremente mencionar tais aspectos, a fim de que quando
começar a campanha já seja de certo modo conhecido pelo eleitorado.
Fugir dessa compreensão é fazer tábula rasa à própria
compreensão da propaganda eleitoral em espécie e minar o momento próprio para
que o pretenso postulante ao cargo público se apresente formalmente ao eleitor,
aí sim podendo pedir o seu voto e ir muito além do que o artigo comentado
permite.
E tanto é verdade que a menção a pré-candidatura é
limitada às sete (agora sete) situações que serão comentadas nos demais textos,
não podendo se interpretar agora que um possível candidato possa tratar de sua
postulação em qualquer tipo de situação.
Sinceramente, se não for assim, para que temos um marco
temporal de início de campanha eleitoral?
Alguns dos últimos julgados do TSE na matéria e para nós
sintomático na linha defendida, parece confirmar as primeiras impressões de
nosso pensamento, senão vejamos:
Ementa: AGRAVO REGIMENTAL. AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL.
ELEIÇÕES 2016. REPRESENTAÇÃO. PROPAGANDA ELEITORAL ANTECIPADA. CONFIGURAÇÃO.
PEDIDO EXPLÍCITO DE VOTO. DISCURSO. EVENTO. LANÇAMENTO. PRÉ-CANDIDATURA.
RESPONSABILIDADE. PARTIDO POLÍTICO. MULTA.
SÍNTESE DO CASO: 1. (...) veiculação de pedido explícito
de votos em discursos proferidos durante evento de lançamento de précandidatura
organizado e custeado por ele, em conjunto com outra agremiação. (...)
O Tribunal de origem entendeu configurado pedido
explícito de voto em discursos proferidos durante evento de lançamento de
pré-candidatura ao cargo de prefeito, tendo sido utilizada, em um deles e com
referência ao nome da pré-candidata, a expressão "vamos eleger", a
qual tem similitude semântica com pedido explícito de votos e autoriza a
conclusão pela ocorrência de propaganda eleitoral extemporânea. (...)
(AI nº 3316 - Rio de Janeiro/RJ - Rel. Min. Sérgio Banhos
- DJE 19/11/2019)
AGRAVO REGIMENTAL. RECURSO ESPECIAL. ELEIÇÕES 2016.
REPRESENTAÇÃO. PROPAGANDA ELEITORAL EXTEMPORÂNEA.ENTREVISTA. TELEVISÃO. PEDIDO
EXPLÍCITO DE VOTO. CONFIGURAÇÃO. ART. 36-A DA LEI 9.504/97.
PRECEDENTES.RECONSIDERAÇÃO. PROVIMENTO DO AGRAVO PARA NEGAR SEGUIMENTO AO
RECURSO ESPECIAL.1. Propaganda extemporânea caracteriza-se apenas na hipótese
de pedido explícito de voto, nos termos do art. 36-A da Lei 9.504/97 e de
precedentes desta Corte.2. Extrai-se da moldura fática do aresto do TRE/CE que
o agravado, ao conceder entrevista à emissora TV Sinal antes de iniciada a
campanha, proclamou que "eu vou ter muita honra de ser prefeito da cidade,
se Deus permitir e o povo; a única coisa que eu peço ao povo é o seguinte: ter
esta oportunidade de gerir" (fl. 90).3. Agravo regimental provido para,
sucessivamente, negar seguimento ao recurso especial e, por consequência,
manter a multa de R$ 5.000,00 por prática de propaganda antecipada imposta a
Bismarck Costa Lima Pinheiro Maia.
(Recurso Especial Eleitoral nº 1087, Acórdão, Relator(a) Min. Jorge Mussi,
Publicação: DJE - Diário de justiça eletrônico, Tomo 59, Data 26/03/2018,
Página 7)
[1] Foge totalmente ao objetivo desse
texto tratar de outra indiscutível mudança que se operou na legislação, qual
seja, a limitação de gastos e restrição ao uso do poder econômico como fator
determinante para o desempenho dos candidatos, já que mais uma vez tivemos não
só abreviação do tempo de campanha, mas alterações que buscam impactar
diretamente no seu efetivo custo e talvez tais alterações tenham se dado
justamente porque ninguém aguenta mais campanhas tão caras e muitas vezes
promíscua no que tange a compra da consciência das pessoas, logo a mudança
nesse sentido foi uma imposição da própria sociedade e os nossos políticos, em
sua grande maioria, tiveram de engolir “goela abaixo” como se diz.
[2] Um pensamento quase que automático
que tivemos aos nos deparar com a modificação imposta pela lei 13.165/2015 na
matéria em análise, foi a de que houve uma patente compensação quanto ao
encurtamento mencionado, pois tal abreviação indiscutivelmente prestigia quem
já está no poder e que regra geral fará de tudo para continuar no mesmo, logo
quem será candidato pela primeira vez ou não está no poder tem de se apresentar
a sociedade antes do início da campanha, sob pena de sequer dá tempo de ser
conhecido pelo eleitor.
Por Herval Sampaio, Juiz de Direito no Estado do Rio
Grande do Norte, Presidente da Associação dos Magistrados do Rio Grande do
norte (AMARN) e Vice Presidente de Integração da Associação do
Magistrados do Brasil (AMB)
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