Os efeitos da pandemia do coronavírus estão sendo mais
alarmantes e nocivos do que previam todas as autoridades envolvidas na
tentativa do seu controle o mais imediato possível. O rastro de mortes nos
últimos dias deste abril catastrófico faz amadurecer ainda mais a ideia de que
as eleições municipais estão caminhando celeremente para o adiamento já
previsto por especialistas em tragédias dessa natureza, cientistas políticos,
marqueteiros e os próprios políticos.
Em entrevista ao jornal Folha de São Paulo, o ministro
Luis Roberto Barroso, do STF, que assume no próximo mês a presidência do
Tribunal Superior Eleitoral, assumiu uma postura inflexível diante de qualquer
tentativa de remeter o pleito para 2021 ou 2022. Admitiu, entretanto, que seja
possível a não realização em 4 de outubro, como está prevista, mas em novembro.
Segundo ele, a aglomeração das convenções partidárias e a fase de testes das
urnas eletrônicas são os principais obstáculos à realização das eleições
municipais de outubro em meio à pandemia do novo coronavírus.
“Se chegarmos em junho sem um decréscimo substancial da
pandemia, é possível ter que fazer esse adiamento, que não deve ser por um
período mais prolongado do que o absolutamente necessário para fazerem eleições
com segurança. Gostaria de trabalhar com a ideia de que não seja necessário
adiar e que, se necessário, que estejamos falando de algumas semanas e nada
mais do que isso”, afirmou.
Barroso não é claro quanto à nova data para o pleito, mas
quando se mostra contrário a qualquer tentativa de prorrogação de mandato ou
coincidência geral em 2022, deixa a entender que o primeiro turno se daria em
15 de novembro e o segundo 20 dias depois, já em dezembro. “Há questões
políticas e operacionais. As políticas são as datas das convenções partidárias,
que têm limite até 5 de agosto e envolvem aglomeração. Além do próprio início
da campanha, em 15 de agosto. Portanto, se houver risco de aglomerações em
agosto, temos um problema”, alerta.
Além disso, segundo ele, o sistema de urnas eletrônicas
funciona primorosamente bem, mas depende de testes de segurança ao longo do
período. “Temos como marco em junho para fazermos os testes e correções. Já
temos o número de urnas suficiente para fazermos as eleições. A despeito disso,
periodicamente se substitui uma parte das urnas que vão ficando antigas. Se
isso não for possível, apenas teremos que aumentar o número de eleitores por
urna”, afirmou.
Não é só o presidente da corte que conduz as eleições que
está inseguro. Diante de uma catástrofe na saúde que não se sabe ainda da sua
real dimensão, com o medo aflorando nos corações de todos os brasileiros,
arriscar um palpite se iremos às urnas ou não este ano é uma temeridade.
Falaram que o pior seria abril, o ministro da Saúde já fala em junho sem ter
certeza disso. O fato é que não dá para fazer uma campanha de rua sem povo nas
ruas. Também não se faz campanha sem apertos de mãos e abraços. A presença
física é indispensável. E não se vai às urnas também sem se preceder a uma
campanha.
Contra prorrogação – Sobre
a tese de adiamento das eleições ou sua coincidência em todos os níveis em
2022, o futuro presidente do TSE foi contra e assim se justificou: “A
prorrogação de mandato deve ser evitada até o limite do possível. Se ocorrer,
que seja pelo mínimo tempo possível. Sou totalmente contrário à ideia de se
fazer coincidir com as eleições em 2022, por questão de respeito ao princípio
democrático, pois os prefeitos e vereadores foram eleitos por quatro anos e não
têm mandato popular para ir além. Acho que não mudar as regras do jogo é um
valor importante a ser preservado”.
Um choque – Ainda
sobre o cenário de incertezas que reina no País em relação às eleições, Barroso
diz que a pandemia jogou luz sobre a desigualdade abissal que existe. “O
Brasil tem sido o país do nepotismo, do compadrio. Precisamos revalorizar o
mérito e a virtude. Nós só universalizamos o ensino básico cem anos depois dos
Estados Unidos. Estamos precisando de um choque de iluminismo em muitas áreas.
Em toda parte do mundo pesquisa depende de apoio governamental, e olha que quem
está falando isso é uma pessoa que defende a diminuição do Estado econômico
brasileiro, não a diminuição do estado social”, afirmou.
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