O bioma caatinga está inserido no Semiárido brasileiro,
região delimitada pela Superintendência de Desenvolvimento do Nordeste (Sudene)
considerando condições climáticas
dominantes de semiaridez, em especial a precipitação pluviométrica. Como
reflexo das condições climáticas,
a hidrografia é frágil,
em seus amplos aspectos, sendo insuficiente para sustentar rios caudalosos que
se mantenham perenes nos longos períodos de ausência de precipitações.
Constitui-se exceção
o Rio São Francisco. Devido às características hidrológicas, as quais permitem a sua sustentação
durante o ano todo, o Rio São Francisco adquire uma significação especial para
as populações ribeirinhas e da zona do Sertão.
Essa região é marcada por um dos biomas mais
característicos do cenário nacional, especialmente por ser o único genuinamente
nacional. A palavra caatinga advém do tupi guarani e significa "mata
branca", ou "floresta branca". Formada a partir dos elementos
ca-a (floresta), tî (branco) e o sufixo ngá, (que lembra). São quase 900 mil km² de vegetação rasteira, com galhos retorcidos e que é
marcada pela resistência ao clima impiedoso e abriga uma fauna e flora diversa,
que para muitos causa espanto.
Desse modo, a caatinga se destaca por sua vegetação com aparência inóspita,
muitas aves, répteis, entre outras espécies que marcam um bioma que deveria ser
cuidado, tendo o destaque que merece.
Convém citar que a Constituição de 1988 cometeu grave omissão
ao não elevar a catinga e o cerrado à condição de Patrimônio Nacional (§4º do
artigo 225). Tal omissão, infelizmente, revela um descaso que precisa ser
corrigido o mais rápido possível, até porque o bioma caatinga, não
obstante a sua capacidade de regeneração diante de impactos diretos ao seu
ambiente, não deixa de ter a sua grande fragilidade ecológica, isso porque não
há área mais propícia no Brasil à manifestação do fenômeno da desertificação,
que pode ser definido como a degradação de terras em áreas de clima semiárido
ou subúmico seco, trazendo como principais consequências a perda do potencial produtivo
dos solos, o agravamento do déficit hídrico e a redução da biodiversidade.
Sobre a redução da biodiversidade, Faria (1980, página
212) destaca que o canto lamuriento de Nicandro Nunes da Costa
(1829-1918), anotado por Rodrigues de Carvalho no Cancioneiro do Norte, já
dizia:
Ferri (1980), lembrando Euclides da Cunha, em seu clássico
livro "Os Sertões", assim se refere à caatinga: "...A
caatinga o afoga; abrevia-lhe o olhar; agride-o e estonteia-o; enlaça-o na rama
espinescente e não o atrai; repulsa-o com folhas urticantes, com o espinho, com
os gravetos estalados em lanças; desdobra-se-lhes na frente, léguas e léguas,
imutável no aspecto desolado: árvores sem folhas, de galhos estorcidos e secos,
revoltos, entrecruzados, apontando rijamente no espaço ou estirando-se
flexuosamente pelo solo, lembrando um bracejar imenso de tortura da floresta
agonizante...".
Em síntese, o ambiente do semiárido brasileiro apresenta-se
com uma área plenamente adaptada aos rigores climáticos a que está submetido,
uma vez que as plantas e animais criaram mecanismos instintivos e inteligentes
para o convívio com as secas cíclicas que ali ocorrem. O homem precisa, e com
urgência, aprender com essas outras espécies vivas como melhor interagir com as
adversidades naturais presentes na região. Para isso, o conjunto normativo pode
contribuir para a indução de ações e medidas de combate a degradações
significativas no ecossistema semiárido, seja no domínio das caatingas, seja no
domínio dos cerrados ou de qualquer outra formação florestal presentes na área
em questão.
Cerca de 80% do território desse bioma já sofreu algum tipo
de interferência, e atualmente apenas 1% de sua extensão está protegido como
Unidade de Conservação de Proteção Integral, e 36% em unidades de conservação de
outras modalidades menos rígidas, previstas pelo Sistema Nacional de Unidades
de Conservação (SNUC).
Observando-se a extensão do semiárido, e as unidades de conservação incluindo
as Reservas Particulares do Patrimônio Natural (RPPN), é muito claro que há uma
baixa proteção da caatinga brasileira. No que se refere às unidades federais
tem-se muito poucas, sendo a maioria de regime de uso sustentável que permite
um manejo que permite exploração e interferência do homem. Destaquem-se as
palavras de Freire et al (2018, página 11) que asseveram
a necessidade de um cuidado especial com esse bioma:
"Desse modo, o Bioma Caatinga, sendo o único
exclusivamente brasileiro e, ainda hoje, o menos estudado, revela um quadro
social composto por um mosaico diferenciado e complexo. Além disso, a região
vem sofrendo um contínuo e
sistemático processo de degradação ambiental. O consumo de seus ativos
ambientais ao longo do período da ocupação europeia e, mais recentemente,
dos variados processos econômicos e sociais que se instalaram na região, e
que de alguma forma e intensidade vêm explorando de maneira não sustentável
seus limitados recursos naturais, indicam que o Bioma Caatinga está sob forte
ameaça quanto à conservação de sua biodiversidade".
O "Atlas das Caatingas", documento pioneiro,
apresenta uma robusta pesquisa que acende a "luz vermelha" em relação
à proteção da caatinga. Freire et al (2018)
percorreram 14 unidades de conservação no semiárido e constataram que, mesmo
com certo nível de proteção jurídica, esses territórios estão sofrendo diversos
níveis de degradação, apesar de existir uma dinâmica otimista de regeneração da
fauna e flora. Porém, verificou-se que as unidades de conservação estão
abandonadas, sem infraestrutura, com níveis consideráveis de conflitos
socioambientais, além das pressões de dinâmicas produtivas que degradam esse
ambiente, que já é extremamente vulnerável (SILVA, 2014; SILVA et al,
2016).
Isso chama atenção para fato de que a legislação por si só
não é suficiente. Para além disso, é preciso um pacto com a sociedade,
incluindo as comunidades que estão no entorno dessa unidades, bem como inserir
a caatinga no roteiro de políticas públicas ambientais. Claro que é condição
para isso reparar a injustiça que se fez na Constituição Federal de 1988 que
não elencou a caatinga como sendo patrimônio nacional (CF, artigo 225, §4º), o
que foi no mínimo estranho, uma que se trata do único bioma totalmente
nacional. Para além disso, a legislação infraconstitucional reproduziu essa
omissão, tanto que o Código Florestal que traz diverso dispositivos voltados à
floresta amazônica e cerrado mas nada sobre a caatinga, sem falar que existe
lei específica sobre o cerrado e a Mata Atlântica.
Portanto, é patente a frágil proteção legal que tem o bioma
caatinga. Como se não bastasse tem-se grandes outros problemas como a
progressiva desertificação e a falta de saneamento básico. Quanto ao
saneamento, o Sistema Nacional de Informações sobre Saneamento (SNIS) dá conta
que apenas 28% da população do nordeste tem acesso à coleta de esgoto e ao
tratamento desse (SNIS, 2019). tem-se aí o prenúncio de uma tragédia ambiental,
tendo em vista que a maior parte dos municípios do semiárido não possuem
disposição final adequada desses resíduos o que significa dizer que são
lançados diretamente no meio ambiente sem o tratamento correspondente mínimo.
Assim, o fato é que não se tem muito a comemora neste 28 de
abril de 2021, Dia Nacional da Caatinga,
pois os dados demonstram que ainda é preciso avançar muito na proteção desse frágil
bioma, criando uma estrutura de proteção da sua biodiversidade e dos seus
recursos naturais de maneira geral, de modo que a política pública ambiental
seja levado a cabo. Isso é urgente, tendo em vista a expansão de atividades que
degradam o meio ambiente, como a mineração, o desmatamento, a queimada, somado
a isso o processo de mudanças climáticas que atingem essa zona brasileira de
forma especial e intensa. Como proposta para mitigar os efeitos desse processo
de degradação, seguem as seguintes sugestões:
- Mapear e diagnosticar áreas;
- Definir planos de contingência;
- Criar sistema integrado de informações de alerta precoce para ocorrência de secas;
- Criar centros de pesquisa para o desenvolvimento de tecnologias;
- Promover conservação e uso sustentável dos recursos naturais;
- Fomento de práticas sustentáveis;
- Ecosilvicultura;
- Manejo silvipastoril;
- Agricultura de baixo carbono;
- Produção sustentável de carvão vegetal;
- Manejo extrativista de produtos não madeireiros;
- Capacitar técnicos em extensão rural;
- Disseminar práticas de convívio com as secas;
- Construir sistemas de captação de água das chuvas — cisternas;
- Construção de barragens subterrâneas e superficiais;
- Criar parques, jardins botânicos, hortos florestais e bancos de sementes crioulas;
- Criar sistemas de parques e jardins zoológicos e zoobotânicos e centros de conservação e recria de animais;
- Reintrodução de espécies ameaçadas de extinção;
- Estimular agroindústrias e unidades de beneficiamento artesanais e familiares que promovam:
- Produção regional;
- Extrativismo sustentável;
- Tradições culturais locais;
- Reuso de água;
- Revegetação e reflorestamento;
- Irrigação sustentável em áreas susceptíveis à desertificação;
- Mapear áreas sujeitas à salinização e à alcalização dos solos;
- Recuperar solos salinizados ou alcalinizados;
- Praticar a agricultura familiar em bases ambientalmente sustentáveis;
- Sistemas de saneamento individual familiar para a zona rural do semiárido que conta com 11 milhões de habitantes.
- PSA para a preservação da caatinga, notadamente no que diz respeito aos pequenos e médios proprietários;
- Criar um observatório geral da caatinga;
- Desenvolver um programa de educação ambiental específico para a valorização da caatinga;
- Fazer um levantamento das áreas degradadas da caatinga;
- Efetivar a política de combate à desertificação no bioma caatinga;
- Estabelecer um programa de levantamento dos bens culturais imateriais relacionados à caatinga;
- Estabelecer uma sistemática de criação de UCS e áreas protegidas de maneira geral no âmbito da caatinga;
- Estabelecer uma sistemática de criação de bancos genéticos da caatinga nas principais cidades do semiárido nordestino;
- Inserir a caatinga como patrimônio nacional no artigo 225 da cf/88;
- Zoneamento arqueológico da caatinga; e
- Levantamento do patrimônio cultural imobiliário.
* O presente trabalho foi resultado do grupo de estudos do
bioma caatinga no evento "Biomas Nacionais", ocorrido em 21 de
outubro de 2020 sob a coordenação geral da
Prof. Dra. Consuelo Yatsuda Moromizato Yoshida (PUC/SP e Unisal/SP), da Prof.
Dra. Érika Bechara (PUC/Cogeae/SP) e da Prof. Dra. Regina Vera
Villas Bôas (PUC/SP e Unisal/SP). O objetivo foi chamar atenção para os
diversos ecossistemas existentes no vasto território do país, de forma a destacar também a presença
dos biomas que não ocupam um lugar de destaque no cenário nacional ofuscados
pela imponência da Amazônia.
Fonte: Conjur.com
0 comentários:
Postar um comentário