A notícia de que o Supremo Tribunal Federal tomou medidas
para reduzir o impacto das decisões monocráticas de seus integrantes e
evitar que pedidos de vista se prolonguem indefinidamente é uma das mais
importantes deste final de ano. São gestos de autocontenção, que podem
fortalecer a imagem da corte daqui em diante.
A percepção de que o STF havia se convertido em um “arquipélago
com onze ilhas” fez muito para desgastar a sua legitimidade nos últimos
anos. Decisões solitárias em casos polêmicos consolidaram, entre muita
gente, a ideia de que os ministros usam seus cargos para fazer valer opiniões
políticas pessoais, e não para definir o sentido das leis de maneira
colegiada.
É verdade que o bolsonarismo, seguindo à risca o
manual dos populistas, que manda minar o prestígio do
Judiciário, escolheu o tribunal como inimigo número um nos últimos
anos. Mas, se não tivesse um substrato de verdade, a campanha contra
ministros “autocráticos” não teria ganhado tração.
Dois anos atrás, o ministro Luiz Fux tomou
posse na presidência do tribunal dizendo que pretendia combater o “time
do eu sozinho” e reavivar o espírito de colegialidade entre seus
colegas. Já existia, portanto, um diagnóstico claro a respeito dos riscos que o
excesso de decisões monocráticas implicava.
A proposta de Fux não avançou. Talvez o fato de ter
anunciado o seu projeto em voz alta tenha desagradado os outros ministros. Logo
em seguida, o STF mergulhou em um dos períodos mais conturbados de sua
história. Os inquéritos das fakes news e dos atos antidemocráticos deram poder
de polícia e exposição inéditos a um único ministro, Alexandre de Moraes – em
vez de tornar o tribunal mais uno.
A ministra Rosa Weber (foto) assumiu a presidência do STF
em setembro deste ano. A resolução sobre decisões monocráticas e pedidos
de vista foi tomada sem alarde, em uma reunião administrativa, e demorou alguns
dias para vir à tona.
Assim que as novas regras entrarem em vigência, um
julgamento poderá ser retomado depois de 90 dias, se um ministro que pediu
vista ainda não tiver devolvido o processo. Além disso, medidas cautelares
tomadas por um único ministro, que atinjam direitos individuais ou coletivos –
a prisão de um parlamentar, por exemplo, ou a suspensão de um ato normativo de
outro poder – terão de ser submetidas imediatamente ao plenário.
Se essas mudanças tivessem vindo antes, teriam reduzido
as investidas do bolsonarismo contra o STF? Provavelmente não, porque a crítica
ao judiciário havia se convertido em plataforma de luta política, e não em
argumentação para melhorar o trabalho da corte.
O fato de as mudanças estarem acontecendo mostra, no
entanto, que os ministros sabem que um “déficit de colegialidade” enfraquece
a instituição e que a melhor solução é que eles mesmos refreiem suas
vontades autônomas.
Antes tarde do que nunca.
O Antagonista
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