Olho D'água do Borges/RN -

Os 3 erros que levaram às invasões em Brasília, segundo especialistas

 

Alertas subestimados, demora para mobilizar tropas e leniência com o acampamento de bolsonaristas em Brasília.

Esses foram os três principais erros apontados por especialistas em segurança pública ouvidos pela BBC News Brasil que, segundo eles, teriam levado à invasão do Palácio do Planalto, Congresso Nacional e Supremo Tribunal Federal (STF).

Neste domingo (8/1), milhares de apoiadores do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) ocuparam a Esplanada dos Ministérios, na área central de Brasília e, de lá, invadiram e depredaram as instalações do Palácio do Planalto, do Congresso Nacional e do STF. Os prédios são as sedes dos três Poderes da República.

A invasão aconteceu após diversas convocações feitas em redes sociais como grupos de WhatsApp. Os invasores pedem o fechamento do Congresso Nacional, intervenção militar e são contra a eleição do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT).

Em resposta, Lula anunciou neste domingo (08/01) uma intervenção federal na área de Segurança Pública do Distrito Federal.

Para chegar aos edifícios, os invasores enfrentaram policiais militares e as equipes de segurança do STF, Congresso e Palácio do Planalto.

De acordo com imagens e relatos feitos por canais de TV como a GloboNews, os bolsonaristas danificaram gravemente diversos ambientes dos três prédios.

A invasão, no entanto, aconteceu em uma das áreas que, supostamente, deveriam ser mais bem guardadas do país.

Diante disso, a pergunta que especialistas têm se feito nas últimas horas é: que erros foram cometidos pelas autoridades e que levaram à invasão de três dos mais importantes prédios do Brasil?

Alertas subestimados

A possibilidade de invasão a prédios públicos na Esplanada dos Ministérios e na Praça dos Três Poderes, na área central de Brasília, já vinha circulando em grupos de WhatsApp bolsonaristas há pelo menos quatro dias.

Diversas convocações foram feitas pelas redes sociais e a expectativa era de que dezenas de ônibus com apoiadores de Bolsonaro chegassem a Brasília neste final de semana.

A BBC News Brasil teve acesso a um vídeo que circulou em um desses grupos em que há uma clara convocação para a invasão.

"Ninguém está falando em acampar, nada… nós estamos falando de tomar Brasília como o povo do Sri Lanka fez", diz um trecho do vídeo com imagens da invasão do palácio presidencial do país asiático, em julho de 2022.

Para o ex-secretário de segurança pública do Distrito Federal Arthur Rodrigues, houve negligência das forças de segurança locais em relação ao tamanho das manifestações.

"Essa manifestação estava prevista e era de conhecimento público. Sabia-se há muito tempo sobre a possibilidade de haver quebra-quebra. Claramente, o efetivo colocado para lidar com essa manifestação não foi compatível com o tamanho da mobilização", diz o ex-secretário.

Até o momento, não foram divulgados os números oficiais sobre a quantidade de invasores e a quantidade de policiais militares presentes na área atingida. As imagens veiculadas, no entanto, mostram que o número de agentes de segurança era bastante inferior ao de invasores.

Imagens transmitidas por canais de TV mostram um agente de segurança montado em um cavalo sendo cercado e agredido por bolsonaristas nas imediações do Congresso Nacional sem qualquer apoio ou reforço policial.

Para o presidente do conselho de administração do Fórum Brasileiro de Segurança Pública (FBSP), Cássio Rosa, os alertas em relação às manifestações foram subestimados.

"O aparato de segurança colocado pelo governo do Distrito Federal não era adequado para o tamanho da manifestação. A PM local é extremamente bem treinada para lidar com multidões. Se o efetivo fosse compatível, dificilmente estaríamos tendo esse tipo de invasão", afirmou Rosa.

Procurada, a Secretaria de Segurança Pública do Distrito Federal (SSP-DF) não respondeu às questões da reportagem.

Demora no uso da Força Nacional

Um outro elemento destacado pelos especialistas foi a demora na mobilização das tropas da Força Nacional.

No sábado (7/1), o ministro da Justiça, Flávio Dino (PSB), anunciou que autorizou o uso da Força para garantir a segurança na área da Esplanada dos Ministérios em função dos protestos que estavam sendo convocados por bolsonaristas.

"Além de todas as forças federais disponíveis em Brasília, e da atuação constitucional do Governo do Distrito Federal, teremos nos próximos dias o auxílio da Força Nacional. Assinei agora portaria autorizando a atuação, em face de ameaças veiculadas contra a democracia", disse Dino em seu perfil no Twitter.

A previsão inicial era de que a manifestação mais forte fosse ocorrer na segunda-feira (9/1). A autorização dada por Dino previa o emprego de tropas da Força Nacional entre o sábado e a segunda-feira.

Na avaliação do ex-policial civil, cientista político e membro do FBSP Guaracy Mingardi, houve demora na utilização das tropas.

"O governo federal demorou a mobilizar Força Nacional. Os agentes dessa tropa, que são formados por policiais militares de todo o país, deveriam ter sido reunidos mais cedo e colocados de prontidão. Ainda é cedo para avaliar, mas acredito que pode ter faltado agilidade nessa mobilização", afirmou Mingardi.

Arthur Rodrigues, por sua vez, avalia que a convocação da Força Nacional pode ter tido um efeito colateral em relação ao objetivo final do governo federal, que era garantir a segurança da Esplanada dos Ministérios.

"O uso da Força Nacional foi inócuo porque aliviou, em certa medida, a responsabilidade do governo do Distrito Federal de garantir a segurança na região, e colocou isso no colo do governo federal. Quem está acostumado a atuar naquela região é a PM", disse Rodrigues.

A reportagem questionou o Ministério da Justiça sobre as alegações feitas pelos especialistas ouvidos pela BBC News Brasil, mas o órgão não respondeu às perguntas até o momento.

Leniência com acampamento e militantes bolsonaristas

Outro ponto indicado por especialistas que pode ter contribuído para a dimensão dos atos deste domingo foi a suposta leniência das autoridades em relação ao acampamento de bolsonaristas em frente ao Quartel General do Exército e com os militantes violentos que participaram de atos de vandalismo nas últimas semanas.

No dia 12 de dezembro do ano passado, data da diplomação de Lula no Tribunal Superior Eleitoral (TSE), um grupo de bolsonaristas ateou fogo em carros, ônibus e tentou invadir a sede da Polícia Federal, em Brasília.

Os atos aconteceram após a prisão de um indígena bolsonarista determinada pelo ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Alexandre de Moraes.

Apesar da violência empregada pelos militantes, a PM do Distrito Federal não prendeu ninguém, o que gerou críticas de uma suposta conivência das forças de segurança locais com os bolsonaristas.

Dias depois, porém, um militante bolsonarista foi preso por sua ligação com uma tentativa de atentado a bomba ao Aeroporto Internacional de Brasília.

George Washington de Sousa confessou ter montado a bomba ,segundo a polícia.

Segundo depoimento prestado por ele à Polícia Civil do Distrito Federal, sua intenção era que a bomba gerasse caos e levasse à imposição de um estado de sítio antes da posse de Lula como presidente.

Em seu depoimento, Sousa disse que encontrou militantes dispostos a conduzir o atentado no acampamento de bolsonaristas em frente ao Quartel General do Exército.

Apesar disso, as autoridades do Distrito Federal não desmobilizaram o acampamento. Centenas de pessoas ocupam uma área em frente à sede da força há pouco mais de um mês.

Agentes do governo local chegaram a tentar desocupar a região, mas foram rechaçados pelos militantes e recuaram.

Nos dias que se seguiram, bolsonaristas e militantes em favor de pautas como o fechamento do Congresso Nacional e intervenção militar seguiam indicando o acampamento em Brasília como um ponto de encontro do grupo.

Para Cássio Rosa, a forma como as autoridades locais lidaram tanto com o acampamento quanto com os atos de vandalismo do dia 12 de dezembro deram combustível para os episódios deste domingo.

"Os momentos seguintes aos atos de vandalismo no ano passado foram uma oportunidade de arrefecer os ânimos. Era uma chance de negociar, conversar e tirar aquelas pessoas daquele acampamento, mas, infelizmente, isso não aconteceu", disse.

 Fonte: BBC.com

 


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