Nas últimas semanas, vários potiguares tiveram prejuízos em
decorrência da onda de ataques contra prédios públicos e privados desde o
dia 14 de março. Para o advogado e professor Diogenes da Cunha Lima, é preciso
haver a responsabilização do Estado e da União no que diz respeito aos
prejuízos sofridos pela população e pelo setor produtivo. “Se houve todo esse
movimento com prejuízos causados, extraordinariamente, há o dever e obrigação
de ressarcir”, diz.
Presidente
da Academia Norte-rio-grandense de Letras e conselheiro do Instituto do
Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (IPHAN), Diógenes, escritor com 35
livros publicados entre ensaios, biografias, poesia e Direito, também fala do
papel da classe política e do judiciário para, valendo-se desse momento de
dificuldade, observar uma oportunidade de buscar mais recursos para desenvolver
as potencialidades do Rio Grande do Norte.
Como o cidadão prejudicado pela crise na segurança pública pode buscar seus direitos?
É bem
simples. A Constituição Federal assegura que a segurança pública é um direito
do cidadão e um dever de todos, do Governo, sobretudo. E o Governo teve, por
omissão, culpa desse movimento (de ataques criminosos). Por outro lado, a
Constituição Federal estabelece a responsabilidade civil do Estado. Isto foi a
grande pregação do jurista norte-riograndense Seabra Fagundes. Se houve todo
esse movimento com prejuízos causados, extraordinariamente, há o dever e
obrigação de ressarcir, ao nosso ver.
Os prejuízos que o senhor vê, vão além do cidadão comum?
Primeiro, eu
gostaria de dizer que o Rio Grande do Norte é um pobre estado rico. Nenhum
estado brasileiro tem maior potencialidade do que o Rio Grande do Norte. Por
exemplo, um setor que foi altamente prejudicado foi o setor de turismo. O Rio
Grande do Norte, além de ter 400 km de praias belíssimas e extraordinárias, tem
uma série de fatores que tornam a presença do turista e tem crescido esta
vocação natural, mesmo sem grande porte do poder público. Então, essa
calamidade do Rio Grande do Norte, que não foi declarada, mas de fato é um
estado de calamidade, prejudicou muito esse estado que é potencialmente rico.
Por outro lado, compete à União, o direito fundamental de desenvolvimento
nacional, diminuindo as desigualdades regionais e é uma grande dificuldade
regional o estado, que pode ser muito rico, mas que o povo vive em dificuldade.
Os municípios também contabilizam perdas...
As prefeituras que já têm dificuldade, tiveram um prejuízo extraordinário com ônibus escolares queimados, prédios públicos destruídos, equipamentos, inclusive, de limpeza pública. Em outras palavras, os prejuízos foram de vários setores. No setor turismo, que nós falamos, houve um prejuízo claro e que se prolonga. Não é somente hoje, porque o Rio Grande do Norte ficou como um estado inseguro, mais do que isso, muitas pessoas perderam tudo o que tinham. Como um cidadão que tinha quatro ônibus, que lutou ao longo da vida para ter e foram queimados. Um cidadão de Mossoró, que tirava seu sustento de uma caçamba e foi queimada.
O Estado já alega dificuldades financeiras, seria razoável cobrar indenizações?
Diretamente
estabelecer a obrigação do Governo do Estado não é, talvez, a melhor posição,
mas de apoiar o Governo do Estado a fim de que tenha um recurso necessário. Em
casos especiais, o judiciário, pode, por Justiça, não vou dizer por norma
legal, possibilitar acordos, porque isso tem que ser resolvido através de acordo,
com uma avaliação correta dos prejuízos causados, para que seja pago. Em casos
especiais, poderá mesmo o Judiciário atuar. O prejuízo tem que ser suprido
porque é obrigação, é uma responsabilidade civil do Estado.
Então, em se tratando de omissão, é passível de indenização?
Tudo aquilo
que é feito por uma omissão ou por ação dos representantes dos funcionários
governamentais que prejudica, tem que ser indenizado. Ainda que não haja
avaliação particular de cada prejuízo, há uma visão geral de um prejuízo
enorme, que são muitos milhões necessários para suprir. Para o orçamento da
União não é grande coisa, mas para o Estado é muito é importante.
Nesse caso, deve-se recorrer à União?
Para a União
é pouco dinheiro, mas é muito para o Rio Grande do Norte fazer esse
ressarcimento, esse apoio. Então a união da classe política é mais que nunca
necessária para que haja esse aporte, para que haja o repasse de recursos
suficientes para cobrir essas necessidades no setor de turismo. Deve haver no
Ministério do Turismo aportes e facilidades de crédito e dinheiro e recursos
para desenvolver as atividades locais. É muito fácil desenvolver um estado
pequeno como o Rio Grande do Norte, só depende de vontade política.
Qual o papel do judiciário neste cenário?
Um aspecto
curioso é que a lei brasileira infelizmente é limitada. Os poderes dados aos
juízes são muito limitados, por exemplo, no caso do dinheiro público para pagar
esses prejuízos, depois de ter sido avaliado, conseqüentemente, o nexo causal.
Não é possível dizer que é um prejuízo que a pessoa teve naturalmente, mas sim,
que é prejuízo decorrente de um nexo causal. O que foi que causou? Doi a
insegurança do Estado que causou este prejuízo. Infelizmente o juízes são
presos à letra fria da lei. Então, o Judiciário pode ter uma grande
participação nestes episódios.
O Ministro da Justiça anunciou um aporte financeiro. O senhor acha suficiente?
É verdade
que o ministro da Justiça declarou que vem R$ 100 milhões para o sistema
prisional e para, obviamente, guarnecer a polícia, com armamento e outras
coisas dessa natureza. Claro que é muito importante, mas não basta. Há que
indenizar pelo menos repor o que estava aí. A União pode fazer isso e o custo é
baixo para a União. Em calamidades como essa, a União tem entrado com recursos
suficientes para suprir. Será que o RN vai ficar abandonado?
E por onde começar para reaver tantos prejuízos? Aqueles que se sentem prejudicados devem buscar o judiciário?
Ao meu ver a provocação primeira é de caráter político, junto ao Governo Federal. Há muitas coisas aqui importantes, por exemplo, o RN tem prisões com celas para 5 mil presos, mas tem 9 mil ou, no mínimo, 7 mil, muito mais do que é possível comportar. Então, esses presos vivem num caldeirão, com dificuldades de sobrevivência. São necessárias medidas fáceis. Nós temos a Defensoria Pública. O ideal seria fazer semelhante, por exemplo, à Bahia, onde a Defensoria Pública tem um funcionário junto a cada presídio, que anota as coisas. Há 34% de presos no Rio Grande do Norte, ou seja, um terço, que não foram julgados. Então a Defensoria precisa ser apoiada com pessoal qualificado, com criminalistas, que possam exercer essa função e diminuir esse peso e esse drama da segurança pública no Rio Grande do Norte.
É uma forma
de evitar novas crises no sistema de segurança e penitenciário?
Esse é um dos problemas que deve ser enfrentado com o apoio do governo do estado que não pode ser omitir neste quadro. Há que ter um bom senso de verificar que a calamidade pública deixou em grandes dificuldades todos os setores. Quando você tiver a insegurança do cidadão, o sofrimento, o afastamento das empresas e do turismo que trazia bens, renda e emprego para o Rio Grande do Norte, está na hora de todas as medidas, seja tributárias, sejam de repasse de recursos. É dever do Estado indenizar os prejuízos causados.
Como o
senhor avalia essa série de ataques criminosos no RN. É a maior que o senhor
vivenciou?
Eu penso
que, provocado pelo homem, este é o pior momento que nós tivemos. Houve ainda
aquele episódio tristíssimo de Alcaçuz e hoje esta coisa está disseminada com
prejuízo global da sociedade potiguar, que nunca sofreu tanto. Claro que houve
calamidades climáticas, como secas, mas nada se compara ao sofrimento e
abandono que está sendo provocado no RN.
Tribuna do Norte
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