O governo Lula promete uma reforma tributária sobre o consumo neutra para melhorar o sistema. O ministro da Fazenda, Fernando Haddad, afirma que a cobrança incluirá os que hoje não pagam, visando à “justiça social”, mas um dos mais experientes tributaristas do Brasil, a pedido do Poder360, mostra que não é bem assim.
Hamilton Dias de Souza calcula que o setor de serviços pode ter um aumento de até 210% dos impostos pagos por ano com a mudança sobre a tributação defendida no Congresso pela equipe econômica do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT).
O setor de serviços representa 70,9% do PIB (Produto Interno Bruto) brasileiro e tem demonstrado apreensão com as duas propostas que tramitam na Câmara e no Senado. O segmento questiona a alíquota de referência estimada pelo governo para o IBS (Imposto sobre Operações com Bens e Serviços), de 25%.
A criação desse imposto se dará em substituição a outros 5 e deve elevar a carga tributária sobre o setor de serviços. As simulações consideram as regras da PEC (proposta de emenda à Constituição) 45 de 2019 à categoria hoje tributada pelo lucro presumido, mas os cálculos também se aplicam à PEC 110 de 2019.
Um dos exemplos mostra uma escola particular com 500 alunos, faturamento anual de R$ 12 milhões e lucro presumido de R$ 3,8 milhões. No regime atual, paga R$ 678 mil de tributos: 0,65% do PIS, 3% de Cofins e 2% de ISS.
A substituição pelo IBS daria um crédito de 30% para compensar o pagamento de outros impostos. Mesmo assim, o empreendimento pagaria uma carga efetiva de 17,5%, o que corresponde a R$ 2,1 milhões, alta de 209,7%.
Veja no infográfico abaixo como seria:
Outra simulação diz respeito a uma empresa de transporte intermunicipal, com faturamento de R$ 30,5 milhões por ano e lucro presumido de R$ 4,89 milhões. Sobre essa empresa, incidem 0,65% de PIS, 3% de Cofins e alíquota efetiva de 6,48% de ICMS, totalizando 10,13% de carga tributária (R$ 3,09 milhões).
O novo imposto resultaria em uma carga efetiva de 13,5%, ou seja, R$ 4,12 milhões. O aumento seria de 33% no ano.
Após a publicação desta reportagem, o escritório de Hamilton Dias Souza entrou em contato com o Poder360 e enviou um novo cálculo para o exemplo de restaurantes. Na nova conta, o aumento da carga tributária seria de 60,58%, e não de 27,16%. O infográfico (abaixo) foi atualizado.
A carga tributária também subiria para bares e restaurantes. Eis o exemplo abaixo:
A metodologia adotada para os cálculos considera que o
IBS permite a recuperação de crédito por ser não cumulativo –cobrado sobre o
valor agregado entre uma operação e outra. Com isso, a carga efetiva pode ser
menor.
Segundo o advogado Hamilton Dias, esse tipo de imposto
foi “concebido no contexto da era industrial e, não à toa, funciona bem no que
respeita à produção e ao comércio de bens industrializados”. Na visão de Dias,
a finalidade do tributo pode “gerar uma carga desproporcional” a outros setores.
“Por isso, as manifestações tanto do setor de serviços
quanto do setor agrícola têm fundamento”, acrescenta.
O advogado e professor da USP (Universidade de São Paulo)
Heleno Torres avalia que os setores agrícola e de serviços “precisam conhecer
exatamente quais serão os impactos sobre os seus diversos segmentos”.
ALÍQUOTA ENTRE AS MAIORES DO
MUNDO
A alíquota de referência de 25% para o IBS põe o tributo
entre os mais elevados do mundo. O percentual fica atrás só da Hungria, com
27%.
A taxa, contudo, não considera os créditos tributáveis,
que servem para suavizar o impacto final do imposto sobre o consumidor, e
variam de acordo com cada país.
Ao Poder360, o secretário extraordinário da Reforma
Tributária, Bernard Appy, destaca a “transparência” do imposto.
“Por ser totalmente não cumulativo, o imposto pago pelo
consumidor corresponde exatamente à soma de todo imposto pago ao longo da
cadeia de produção e comercialização. Essa é uma das grandes vantagens do IVA
[em referência à natureza do IBS, de valor agregado]. Ele é totalmente
transparente”, disse.
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