Apesar de se declarar neutro na disputa geopolítica
entre Estados Unidos e China, o Brasil parece ter se alinhado claramente aos
chineses e à Rússia. Essa é a percepção e o receio de integrantes do governo
americano ouvidos pela Folha, que alegam que os brasileiros não só não têm
prezado pelo equilíbrio em seus posicionamentos, como teriam adotado uma clara
oposição a Washington.
A reportagem entrou em contato com o Itamaraty com um
pedido de comentário pouco antes da publicação deste texto, mas ainda não houve
retorno.
De fato, em sua visita à China, encerrada neste
sábado (15), o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) fez uma série de
críticas aos EUA, disse que o país incentiva a continuidade da Guerra da
Ucrânia, atacou a hegemonia do dólar e insinuou que os americanos
pressionam o governo brasileiro a boicotar a China. Em seu encontro com Joe
Biden em fevereiro, Lula não usou a Casa Branca como palco para fazer críticas
a Pequim ou a Moscou.
As fontes americanas afirmam não pressionar o Brasil a
não ter relações com o regime de Xi Jinping ou a escolher um dos dois países, os próprios EUA têm grande intercâmbio com a China, argumentam. Mas entendem
que o presidente brasileiro e sua equipe de política externa, liderada
pelo ministro das Relações Exteriores, Mauro Vieira, e o assessor especial
de Lula, Celso Amorim, adotaram um tom aberto de antagonismo aos EUA.
Um dos aspectos mais problemáticos, na visão de
Washington, é Lula enxergar os EUA como um obstáculo para o fim da guerra na
Ucrânia, e a China e a Rússia como os países que vão levar a paz ao conflito.
Em Pequim, o petista afirmou que é preciso que os americanos “parem de
incentivar a guerra e comecem a falar em paz, para a gente convencer o Putin e
o Volodimir Zelenski de que a paz interessa a todo mundo e a guerra só está
interessando, por enquanto, aos dois”.
Também despertou preocupação Lula declarar que
Zelenski, presidente do país invadido, “não pode […] ter tudo” dias antes
da viagem à China, em encontro com a imprensa. Na ocasião, ele também afirmou
que “Putin não pode ficar com o terreno da Ucrânia”, mas que “talvez se discuta
a Crimeia”, o que poderia indicar que, na visão do petista, Kiev deveria abrir
mão do território, anexado por Moscou em 2014, antes da invasão que
culminou com o conflito atual.
Por fim, dizem as fontes americanas, o governo brasileiro
está repetindo fielmente o discurso do Kremlin, que após invadir um país,
violando sua soberania e desrespeitando a Carta da ONU, ainda estaria cometendo
inúmeros crimes de guerra.
Na visão de Washington, o Brasil deveria ter um papel nas
negociações de paz. Eles alegam, no entanto, que as declarações de Lula minam a
credibilidade do país como um mediador equilibrado e neutro.
Folhapress
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